O vulcão Cumbre Vieja, na ilha espanhola de La Palma, no arquipélago das Canárias, entrou em erupção neste domingo (19) após dias de intensa vigilância devido à sua atividade sísmica.
Do dia 11 de setembro até a quinta-feira (16), o Instituto Geográfico Nacional (IGN) da Espanha registrou 4.530 terremotos na região. A atividade do vulcão provoca especial interesse no Brasil pois há uma teoria de que a erupção deste vulcão poderia provocar um tsunami no Brasil.
Apesar de o vulcão estar situado do outro lado do Oceano Atlântico, haveria a possibilidade de o evento geológico provocar um tsunami aqui na costa brasileira?
Para responder a esta pergunta o R7 entrevistou os professores do Instituto Oceanográfico da USP Luigi Jovane e Michel de Mahiques, além do professor George Sand França, professor do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UnB), entrevistado pela repórter Thaís Rodrigues, do R7 Brasília.
Para ler a entrevista com o professor Geord Sand França clique neste link.
Segundo o professor italiano Luigi Jovane, doutorado em Geofísica pelo Instituto de Vulcanologia e Geofísica da Itália, "apesar de o brasileiro não gostar de falar sobre riscos de desastres, existem locais da costa brasileira onde a chance de haver um tsunami é real."
"As praias do Rio Grande do Norte, como Ponta Negra ou Pipa, têm esse risco porque a plataforma continental é curta e no caso de haver um evento de grande energia no mar, não haveria muito espaço para a energia ir se dissipando e poderia chegar à praia com mais força, ocasionando danos.
Ele diz, porém, que a erupção do Cumbre Vieja em si não apresentaria grande risco de ocasionar um tsunami. "O que poderia produzir o tsunami seria o derrubamento profundo de rochas no mar que podem agitar a água e formar uma onda de baixa frequência", explica.
No caso do Brasil o que poderia ocorrer seria o chamado "teletsunami", um tsunami originado em um ponto bastante distante, cuja onda no meio do mar quase não seria perceptível — 'coisa de 30 centímetros' em alto mar — , mas que quando chega à costa ganha impulso e fica bem maior, causando estragos.
"Não seria nada como os tsunamis de 10 metros de altura da Indonésia, nem o de 40 metros de Messina, na Itália, mas poderia ter potencial destrutivo, porque as cidades que poderiam ser atingidas são bastante povoadas, como Natal, explica Jovane.
Já as praias do Sudeste têm menos risco de receber tais ondas destrutivas, pois a plataforma continental que separa as águas profundas do continente, nessa região, é bem maior, o que faria que o choque de uma onda mais poderosa fosse perdendo a força antes de chegar à costa.
O professor Michel de Mahiques explica que, diferentemente do Oceano Pacífico onde as grandes estruturas geológicas favorecem a ocorrência de vulcões e terremotos, no Oceano Atlântico não existe uma frequência tão grande de terremotos e vulcões, "apesar de que eventualmente possam acontecer vulcões como na Islândia e terremotos, como o que aconteceu em Lisboa no século XVIII."
Por conta do terremoto em Lisboa é possível ver, na costa do Marrocos, grandes blocos de rocha que foram deslocados por conta do maremoto.. Segundo o professor na costa brasileira também existem alguns indícios ocasionados por conta do tsunami de Lisboa, mas não são evidências muito "exuberantes".
"Embora em Geologia a gente nunca descarte a possibilidade desses eventos, no caso do litoral brasileiro a probabilidade é bastante remota. Então se existe esse tipo de preocupação neste momento ela tem que ser relativizada. Não é um risco tão grande assim, mas um risco pequeno de acontecer", diz Mahiques.
Ele diz que é importante acompanhar a intensificação do processo. Atualmente a situação encontra-se em fase amarela, mas se a situação piorar aí se pensa de novo.
É importante dizer também que quando há um tsunami gerado lá no Oceano Pacífico, os marégrafos do Brasil conseguem medir alguma oscilação.
O professor Michel de Mahiques explica que esse fenômeno pode ser associado a três fatores:
1) Tsunami originado de um terremoto. Quando acontece um terremoto, ele pode transferir a energia para a água, a onda se propaga a uma velocidade muito grande e essa onda do tsunami vai crescendo à medida que se aproxima da costa.
2) Tsunami originado de uma erupção vulcânica, como aconteceu no caso do famoso vulcão de Krakatoa no início do século XX
3) Tsunami originado de escorregamento, que poderia ser o que aconteceria no caso de Cierro Viejo, que é um pedaço da ilha que está entrando em colapso. "Quando você desloca uma quantidade de massa (terra) muito grande você desloca uma quantidade de água muito grande também."
As três situações não são muito comuns no Oceano Atlântico.
Segundo o professor Jovene, o monitoramento do Oceano Atlântico é bastante eficaz e caso houvesse alterações nas ondas o aviso chegaria com cerca de três horas de antecedência, o que daria tempo para que as pessoas se dirigissem às partes mais altas da cidade.
Sem terremoto, sem tsunami
As Ilhas Canárias compõem um arquipélago espanhol ao largo da costa noroeste da África. O relevo é composto, principalmente, por formações vulcânicas, oriundas da liberação do magma terrestre. Segundo George Sand França, professor do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília (UnB), a possibilidade de vulcanismo gerar um tsunami é quase nula. Ele explicou que a principal causa para o fenômeno de ondas devastadoras é, na verdade, a movimentação de placas tectônicas se acomodando no fundo dos oceanos.
“Não é comum uma atividade vulcânica gerar um tsunami. O que gera um tsunami é um terremoto, ou seja, a pressão entre as placas tectônicas que compõem a Terra. O território brasileiro não fica próximo de nenhum encontro entre placas para que isso pudesse acontecer”, esclareceu.
O pesquisador apontou que a distância entre os dois continentes – americano e africano – é muito grande para que as consequências das erupções sejam sentidas no Brasil. Ele aformou ainda que outra questão importante que deve ser ressaltada é que o vulcão é continental, ou seja, não está submerso no mar. Segundo o especialista, para que esse tipo de vulcanismo causasse alguma alteração marítima, ele “deveria expelir uma rocha muito grande para cair ao mar”, o que é impossível de acontecer.
Para George França, um fator que contribuiu para que essa desinformação circulasse e ganhasse grandes proporções foi uma simulação feita há mais de 10 anos nos Estados Unidos sobre as atividades sísmicas na costa africana. “Após o resultado dessa simulação, muitas pessoas passaram a crer que os vulcões das Ilhas Canárias poderiam afetar o Brasil”.
*Com Thais Rodrigues, do R7 Brasília
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