A vida Luiz Augusto Jr. mudou radicalmente há três anos, quando o ex-ajudante de pedreiro começou a produzir conteúdo relacionado aos jogos eletrônicos em Vigário Geral, comunidade onde mora na Zona Norte do Rio de Janeiro com elevados índices de pobreza e violência.
Graças ao AfroGames, projeto inovador de inserção de esportes eletrônicos (eSports) em áreas carentes, Luiz Augusto recebe uma bolsa-auxílio para estar à frente de seu próprio canal de vídeos na internet, onde se apresenta como "AFG Sr Madruga" e joga Grand Theft Auto (GTA), um dos games de ação mais populares do mundo.
“Comecei a jogar numa lan-house aqui na comunidade, e gastava uma boa parte do meu salário. Quando fui para o AfroGames, minha avó e minha mãe falaram que era impossível ganhar dinheiro com videogame, mas me apoiaram", relembra Luiz Augusto, de 23 anos e primeiro "streamer" (jogador que transmite jogos ao vivo na internet e interage com os espectadores) do projeto desenvolvido pelo AfroReggae, ONG criada por moradores da própria comunidade há 28 anos que promove inclusão e justiça social por meio da arte e educação.
Numa sala exclusiva na sede da ONG na favela, AFG Sr Madruga e outros 100 jovens e adolescentes atendidos pelo projeto têm à disposição o que há de melhor em computadores gamers e equipamentos de áudio e vídeo, além da orientação de profissionais especializados neste setor do entretenimento, que vai acumular este ano US$ 180 bilhões em receitas no mundo, muito acima dos US$ 74 bilhões previstos para a indústria da música e cinema, segundo a consultoria Newzoo.
"Hoje, eu sou reconhecido pelos moradores e quero virar um produtor de conteúdo, um influenciador digital. E aqui estou aprendendo sobre isso", conclui o jovem.
"Quando eu era mais novo, a garotada se juntava para montar uma banda de rock. Hoje, se reúnem para montar uma equipe de eSports. Os games são o novo rock'n roll", afirma Ricardo Chantilly, ex-empresário da área musical, idealizador e um dos diretores do AfroGames.
Sobre o nascimento do projeto, Chantilly lembra que já era amigo dos diretores do AfroReggae, José Júnior, CEO do AfroReggae Audiovisual, e William Reis, atual coordenador do AfroGames.
"Eles queriam um projeto na área musical, mas falei que o caminho era os eSports e o desenvolvimento de games. Combinei de mostrar uma ideia para eles", destaca.
Na apresentação, que continha imagens de campeonatos internacionais e nacionais de jogos eletrônicos em ginásios lotados, um detalhe chamou a atenção dos diretores da ONG: não havia negros e pardos entre o público e equipes participantes das competições.
"Percebemos que não éramos representados naquelas imagens. Por isso falamos: 'por que não montar uma equipe da favela?", relembra William Reis, criado em Vigário Geral e que integra os 55% dos brasileiros que se declaram pretos ou pardos.
Graças ao apoio de empresas privadas, a iniciativa começou em maio de 2019 oferecendo cursos de programação de games e inglês, além de montar sua primeira equipe de League of Legends (LoL), jogo de batalha cujo campeonato mundial realizado naquele ano distribuiu 2,225 milhões de dólares em prêmios.
Com seis integrantes, que recebem um salário mínimo (R$1.100,00) cada, o time misto AFG eSports tem infraestrutura profissional para treinar, com equipamentos de ponta, além de técnico, psicólogo e preparador físico.
"A gente treina de segunda a sexta. E também temos aulas de inglês", destaca Gabriela Evellyn, de 19 anos, conhecida como "AFG Haru", única garota da equipe.
"No jogo, não tem diferença ser mulher. Mas, quando alguém faz algum tipo de gracinha comigo, me esforço mais para derrotá-lo e dizer no final: 'Viu, perdeu para uma mulher'", afirma.
Devido à pandemia, o AFG eSports não participou de nenhum campeonato em 2020, mas isso pode ocorrer ainda neste ano, e pode ser em um evento organizado pelo AfroReggae.
"Em breve vamos abrir um núcleo na comunidade do Cantagalo (em Ipanema, zona sul do Rio). Lá teremos uma arena de eSports, onde pretendemos organizar o primeiro campeonato entre equipes formadas por moradores de favelas", revela Reis.
Como nos jogos eletrônicos, o AfroGames segue passando de fase, superando desafios e dando oportunidades para jovens oriundos de comunidades carentes se profissionalizarem dentro do milionário mundo dos eSports.
0 comentários:
Enviar um comentário