Afinal de contas, as ações individuais ajudam a combater as mudanças climáticas?
Pense um pouco: que diferença faz uma pessoa trocar uma picanha por um prato de lentilhas, decidir pegar um ônibus em vez de usar o próprio carro ou não viajar de avião nas férias, se os outros bilhões de seres humanos que habitam o planeta não fazem nada?
É uma conclusão desanimadora e suscita uma pergunta óbvia, que já deve ter passado pela sua cabeça: por que, então, devemos nos preocupar?
Foi exatamente o que perguntei à ativista ambiental sueca Greta Thunberg, de 16 anos, quando a encontrei no mês passado.
Em vez de pegar um avião para participar de reuniões sobre a mudança climática em Nova York, no fim de agosto, a adolescente optou por cruzar o Atlântico a bordo de um veleiro — aquele que tinha um balde azul para os tripulantes fazerem suas necessidades, lembram?
Quando conversamos no porto de Plymouth, no sul da Inglaterra, ela me disse que "a questão é formar opinião. Ao parar de voar, você não apenas reduz sua pegada de carbono, mas também envia um sinal para outras pessoas ao seu redor de que a crise climática é algo real e isso ajuda a impulsionar um movimento político".
É uma boa resposta e ajuda a explicar por que essa adolescente sueca chamou a atenção do mundo.
Minha reação talvez tenha sido um pouco rude: "Então, você está tentando fazer o resto de nós nos sentir culpados?", perguntei.
"Não", ela respondeu calmamente, e explicou que não acha que seja sua função dizer a outras pessoas como viver suas vidas. Pelo contrário, suas convicções devem guiar seu próprio comportamento.
"Eu não voo por causa do enorme impacto climático da aviação por pessoa."
Ela reconhece, no entanto, que seu caso é peculiar.
"Muitas pessoas ouvem o que tenho a dizer e apareço muito na mídia. Portanto, influencio muita gente e, por isso, tenho uma responsabilidade maior, pois tenho uma plataforma maior."
Anteriormente, ela tentou participar de reuniões por videoconferência, mas não causou tanto impacto.
"Acho que tem um impacto maior se eu e muitos outros jovens estivermos de fato lá."
E, a julgar pela publicidade que recebe, Greta tem razão.
Mas vamos ser honestos, você não é a Greta Thunberg. Mesmo que suas escolhas se espalhem pelo mundo e influenciem algumas pessoas, sua decisão de comer menos carne e diminuir um pouco o termostato não é exatamente o apelo que vai mobilizar o mundo em torno da redução das emissões de carbono.
Então, por que os indivíduos devem fazer a sua parte?
Essa é uma pergunta para um filósofo. É trabalho deles travar debates sobre que princípios devem guiar nosso comportamento.
E eu falei com "o cara". O professor Peter Singer, da Universidade de Princeton, nos EUA, foi classificado como "o filósofo vivo mais influente do mundo" pela revista New Yorker.
Singer se autodefine como um especialista em ética prática e é muito claro sobre essa questão.
Ele não apenas acredita que todos nós devemos tomar uma atitude, como argumenta que há uma obrigação moral muito forte de por que devemos fazer isso.
"Acho que esse é um dos grandes desafios morais do século 21, talvez o maior", diz ele. "Se não estamos agindo, estamos colocando em risco todo mundo que está vivo agora e também as futuras gerações."
Ele compara o fato de você não reduzir suas emissões de carbono com a atitude de pegar uma escavadeira e arrasar as plantações de um pequeno agricultor na África.
Se você fizesse isso, todo mundo concordaria que estaria errado, mas os gases de efeito estufa pelos quais você é responsável geram o mesmo resultado, argumenta.
O fato de a causa estar relacionada a "gases invisíveis" e de que o efeito só poderá ser sentido em um futuro distante não permite que cada um de nós fuja da obrigação moral de agir, insiste Singer.
A razão é que nosso direito à liberdade de ação não se aplica a prejudicar os outros.
Ele sugere outra metáfora. Imagine que há um limite de velocidade em uma rua comercial movimentada e alguém diz: "Vou dirigir lá pisando fundo no acelerador, mas não se preocupe, há uma boa chance de eu não matar ninguém."
Você não diria que "tudo bem", afirma Singer.
"Você diria: 'Não, você não tem liberdade ou direito de colocar outras pessoas em grave risco de serem feridas ou mortas. E é exatamente isso que estamos fazendo ao seguir em frente com os níveis de emissão de gases de efeito estufa que estamos emitindo hoje."
Segundo ele, o fato de que cada um de nós desempenha um papel minúsculo no processo como um todo não importa; nossa obrigação de agir permanece.
Aposto que a maioria das pessoas reconhece instintivamente que há uma força verdadeira nesses argumentos. Então, por que todos nós já não estamos agindo mais para reduzir nossas emissões?
Vamos ouvir o que tem a dizer uma psicóloga comportamental: a professora Kelly Fielding, da Universidade de Queensland, em Brisbane, na Austrália.
De acordo com ela, não somos os espíritos independentes de pensamento livre que imaginamos ser.
"O que vemos como psicólogos sociais é que as pessoas são muito influenciadas pelo que os outros fazem, embora a gente acredite que não seja", explica.
"É um paradoxo. Achamos que tomamos nossas próprias decisões, mas a verdade é que buscamos orientação nos outros sobre como devemos nos comportar."
Quando se trata de mudanças climáticas, o problema é que simplesmente não estamos recebendo as sugestões que precisamos de amigos e familiares, ou, neste caso específico, do governo e das empresas, diz ela.
No entanto, pesquisas mostram que as pessoas no mundo inteiro estão ficando cada vez mais preocupadas com as mudanças climáticas.
Um estudo publicado em junho nos EUA ilustrou essa questão com muita força. O levantamento da Reuters mostrou que, enquanto 69% dos americanos queriam que o governo adotasse ações "agressivas" para combater as mudanças climáticas, apenas um terço estaria disposto a pagar mais US$ 100 para que isso acontecesse.
O que os entrevistados estão dizendo é: "Sim, há um problema, mas não é minha responsabilidade resolvê-lo".
Mas não se desespere, diz a professora Fielding. Estudos realizados por psicólogos comportamentais indicam que é possível reverter essa conclusão na cabeça das pessoas.
Se as pessoas precisam ser estimuladas por outras antes de mudar de comportamento, tudo o que precisamos fazer é impelir algumas a começar a agir e outras a seguirão, ela argumenta.
O que nos leva a fechar um círculo e fazer todo o caminho de volta até Greta Thunberg e aquele veleiro "zero carbono".
Como diz Greta, nossas ações são importantes não porque elas têm um efeito material sobre as mudanças climáticas, mas por causa da mensagem que elas enviam a outras pessoas.
O que você faz influencia seus amigos e familiares e ajuda a criar um espaço político para governos e empresas agirem. E é provável que isso incentive outras pessoas e outros países a fazerem mais.
E isso já está acontecendo. Quem imaginaria que uma empresa que fabrica hambúrguer sem carne pode valer quase US$ 4 bilhões; que o cartel de petróleo mais poderoso do mundo classificaria os jovens ativistas ambientais como a "maior ameaça" para a indústria de petróleo; ou que a mudança climática se tornaria a questão-chave para os candidatos democratas a presidente dos EUA?
Sim, o que estou sugerindo é a possibilidade de um círculo virtuoso. E sim, este é um argumento para que todos nós possamos ser bem mais otimistas em relação ao que pode ser alcançado.
Porque há outro ponto crucial a ser lembrado. A mudança climática não é binária, não apenas acontece ou não acontece. Uma questão importante para todos nós é o nível de mudança climática que o mundo vai sofrer.
Já sentimos um certo grau de aquecimento global. A Organização das Nações Unidas (ONU) pediu que tentássemos limitar a 1,5°C.
O negócio é o seguinte: quanto mais atitude tomarmos, menos nosso clima vai mudar e mais habitável o mundo vai ser para nós, para nossos descendentes e para todo o resto da magnífica abundância de vida na Terra.
Agora, convenhamos, vale a pena fazer algumas mudanças no estilo de vida em nome desta causa, não é mesmo?
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