01/09/2018

Como uma cientista criou a gota de água mais pura do mundo

À esquerda, o bloco de gelo de água ultrapura; e à direita, a gota que se formou com gelo derretido no vácuo
À esquerda, o bloco de gelo de água ultrapura; e à direita, a gota que se formou com gelo derretido no vácuo Ulrike Diebold

Seria mesmo possível deixar uma superfície quase totalmente limpa como prometem certos produtos de limpeza, aqueles que falam em eliminar 99% das impurezas?

Essa questão levou a engenheira física Ulrike Diebold, professora do Instituto de Física Aplicada de Viena, na Áustria, a conduzir um experimento no qual ela diz ter criado uma gota de água tão pura que não deixa nenhum rastro sobre a superfície com a qual teve contato.

"Até mesmo quantidades muito pequenas de impurezas que se dissolvem na água podem aderir a uma superfície", lembra Diebold, em entrevista à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC. "Assim, o que realmente 'vemos' é a 'sujeira' ao invés de átomos da superfície", completa, salientando o quão difícil é encontrar uma amostra totalmente pura.

A professora usa as palavras "vemos" e "sujeira" entre aspas porque se refere a observações feitas em um nível microscópico. Segundo ela, o objetivo da pesquisa é descobrir como a água interage com outras superfícies. "Podemos pesquisar o que acontece na camada atômica mais externa de um material", explica.

Água ultrapura

Para fazer os testes, Diebold e sua equipe escolheram como superfície o dióxido de titânio (TiO2), comumente usado para criar superfícies com capacidade de autolimpeza e propriedades antibacterianas.

Os vidros autolimpantes, por exemplo, têm uma fina capa de TiO2.

Alguns estudos anteriores sugeriam que, ao ter contato com água, o TiO2 mudava a estrutura da superfície.

O experimento de Diebold, no entanto, identificou que não é a estrutura que mudou, mas o que eles estavam realmente vendo era uma camada de moléculas que estão em "quantidades ínfimas" no ar.

Quando fala em "quantidades ínfimas", Diebold refere-se a uma molécula para cada um bilhão de moléculas de ar.

 

'Podemos pesquisar o que acontece na camada atômica mais externa de um material', explica a responsável pelo estudo
'Podemos pesquisar o que acontece na camada atômica mais externa de um material', explica a responsável pelo estudo Getty Images

Para demonstrar que a água não altera o TiO2 mas simplesmente o "suja", Diebold e sua equipe criaram "a gota de água mais pura do mundo". Isso significa que não deixaram nenhum tipo de contaminação sobre onde ela cai.

Mas como essa água foi criada?

A solução para criar essa gota ultrapura foi evitar qualquer contato com o ar. Para isso, os cientistas introduziram um vapor de água purificada em uma câmara de vácuo onde havia um minúsculo cone metálico resfriado a 140°C negativos.

Assim, o vapor dentro da câmara se congela e forma um milimétrico 'iceberg' ao redor do cone que ainda não entrou em contato com o ar. Sob o bloco de gelo, eles colocaram uma amostra de TiO2, que anteriormente também tinha sido limpa a vácuo em escala atômica.

 

Os vidros autolimpantes têm uma fina capa de TiO2
Os vidros autolimpantes têm uma fina capa de TiO2 Getty Images

O passo seguinte foi elevar a temperatura para que o gelo descongelasse e formasse uma gota de água super pura que caiu sobre a amostra. Ao removerem a gota, nada ficou na superfície.

Era justamente o que esperavam os pesquisadores.

"A superfície se manteve atomicamente limpa. Não havia rastros das moléculas que se acumulam quando você expõe a superfície do dióxido de titânio a uma gota de água no ar".

Por que é importante?

Para obter a água mais pura do mundo foi preciso usar uma câmara de vácuo
Para obter a água mais pura do mundo foi preciso usar uma câmara de vácuo Getty Images

 

 

É preciso, antes de tudo, dizer que não é saudável beber água ultrapura. A água potável deve conter certos minerais para que seja seguro ingeri-la.

Dessa forma, a gota mais pura do mundo serve apenas para pesquisas. Além disso, Diebold destaca um detalhe: "Ela está dentro de uma câmara de vácuo, assim, não é fácil de alcançá-la".

"Esses resultados nos mostram os cuidados que precisamos ter ao conduzir esse tipo de experimento", destacou a professora num comunicado sobre a pesquisa.

"Mesmo pequenos traços no ar, que na verdade podem ser considerados insignificantes, às vezes são decisivos."

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