29/06/2018

Empresas abandonam 'influenciadores digitais' que inflam perfis com seguidores falsos

Olivia Rink diz que trabalha 70 horas por semana no seu blog sobre moda e estilo de vida
Olivia Rink diz que trabalha 70 horas por semana no seu blog sobre moda e estilo de vida Olivia Rink/@aesthetiica

A gigante de bens de consumo Unilever decidiu se insurgir contra "influencers" - ou influenciadores digitais - que falsificam sua relevância nas redes sociais para ganhar dinheiro promovendo produtos.

Será o começo do fim da lua de mel entre empresas e "campeões de curtidas" no Instagram?

Todos já ouvimos falar de estrelas do Youtube, Facebook e Instagram que ganham uma fortuna promovendo marcas nas suas páginas das redes sociais. Alguns desses expoentes têm mais de um milhão de seguidores e chegam a ganhar US$ 20 mil por post.

Mas parece que alguns deles estão burlando o sistema para ganhar dinheiro, comprando exércitos de seguidores de empresas que usam bots (robôs) automáticos para criar contas falsas e simular interações.

O engajamento com outros usuários de redes sociais e a quantidade de seguidores são as principais métricas de avaliação dos influencers.

A multinacional Unilever disse que quer ver "mais transparência" na indústria de marketing dos influenciadores digitais. O temor é que, por causa das trapaças para obter "curtidas", os consumidores deixem de confiar nos donos desses perfis e nas marcas associadas a eles.

O Instagram diz que bloqueia milhões de contas falsas todos os dias e trabalha "duro" para construir o relacionamento entre marcas e influenciadores digitais.

Mas alguns dos verdadeiros influencers temem ser atingidos no fogo cruzado. "Eu sou contra os bots", diz a moradora de Nova York Olivia Rink, 27, uma blogueira de moda e estilo de vida que já foi líder de torcida (cheerleader).

 

Será que o boom de marketing por meio de "influencers" está prestes a acabar?
Será que o boom de marketing por meio de "influencers" está prestes a acabar? Olivia Rink/@aesthetiica

"É desencorajador competir com inlfuencers que usam bots para criar engajamentos falsos."

Rink já trabalhou com mais de 600 marcas e diz que dedica quatro horas por dia à audiência do seu blog.

"Eu trabalho duro para criar um conteúdo único e autêntico, que sei que vai agradar ao meu público."

Movimento crescente

Mas a Unilever não é a única marca insatisfeita com os rumos do mercado de influenciadores digitais- algumas redes de hotéis disseram à revista The Atlantic que não querem mais trabalhar com influencers.

Eles afirmam que recebem uma enxurrada de pedidos de hospedagem e despesas gratuitas, mas o retorno desses investimentos não é nada tangível.

Outros resorts passaram a implementar um processo de análise e seleção para garantir que os influenciadores realmente possuem engajamento real e orgânico com o público, sem o uso de bots.

Em outro sinal de desencanto, parece que agências de marketing estão dispensando os influencers de suas estratégias de ação, segundo a agência de marketing baseada no Reino Unido Zazzle Media.

A empresa, que tem 10 mil influencers na sua lista, se surpreendeu ao descobrir que nenhuma das empresas de marketing britânicas que responderam a um levantamento planejavam investir em influencers nos próximos 12 meses.

"Acreditamos que há duas razões para isso. Uma delas é a dificuldade de medir como os influencers realmente afetam as vendas. E há a questão dos bots", diz Simon Penson, fundador e diretor-executivo da Zazzle Media.

 

O público de Natascha Glock é formado, principalmente, por jovens alemães de 18 a 25 anos
O público de Natascha Glock é formado, principalmente, por jovens alemães de 18 a 25 anos Natascha Glock

Natascha Glock, 25, uma influencer de beleza e estilo de vida que mora em Frankfurt, na Alemanha, diz que não é "justo" o uso de bots. "É difícil evitar que isso aconteça. Mas é mais eficiente e você se sente melhor quando seus seguidores são reais, porque você recebe atenção e feedback verdadeiros."

Ela tem mais de 51 mil seguidores - a maioria homens e mulheres entre 18 e 25 anos, na Alemanha- e já trabalhou com 200 marcas, inclusive a Dove, que é da Unilever.

O trabalho como influenciadora digital garante uma boa remuneração, diz a jovem. Mas ela precisou de dois anos para conquistar um público grande o suficiente para atrair as marcas.

Toula Rose, uma blogueira de moda que mora em Londres diz que a "a pressão por audiência" faz com que alguns influenciadores recorram aos bots.

"E algumas marcas só olham para o número de seguidores, sem se importar com o engajamento. Agora, obviamente que não é correto e é injusto (usar bots), mais injusto ainda para as marcas, se elas trabalharem com alguém e não receberem nada por isso."

 

Toula Rose diz que usar bots para alavancar perfis é "incorreto e injusto"
Toula Rose diz que usar bots para alavancar perfis é "incorreto e injusto" Toula Rose

Todas as três mulheres com quem esta reportagem conversou destacam que o Instagram não se resume a fotos bonitas - leva horas para produzir e estilizar as fotos, planejar e criar conteúdo, engajar o público e propor ideias às marcas.

"Eu trabalho pelo menos 70 horas por semana no meu perfil", diz Olivia Rink.

Joio do trigo

Apesar da preocupação, a Unilever não está dispensando os influencers por completo. Na verdade, a empresa considera que esse tipo de marketing tem se tornado uma "parte cada vez mais importante" das estratégias gerais de comunicação.

"A ideia de usar personalidades para reforçar produtos não é nova. Vem de anos e anos atrás, quando estrelas de Hollywood, como Rita Hayworth e Lana Turner, apareciam nas nossas campanhas de sabonete", diz o chefe de marketing da Unilever, Keith Weed,

"Mas os influenciadores digitais acrescentam uma nova e complexa dinâmica. Queremos trabalhar para desenvolver relacionamentos significativos com influencers que são tão apaixonados pelos seus públicos quanto nós somos pelas pessoas que usam nossos produtos no dia a dia."

 

Estrelas de cinema como Rita Hayworth já estimulavam a compra de produtos na década de 1940
Estrelas de cinema como Rita Hayworth já estimulavam a compra de produtos na década de 1940 Getty Images

Mas a empresa admite que é difícil verificar o exato impacto dos influencers em relação a outras formas de publicidade. Algumas marcas acreditam que qualidade não é quantidade e que esse pensamento é "chave" quando se fala em rede social.

Por exemplo, a Melissa, marca brasileira de sapatos, que tem 270 lojas pelo mundo, diz que prefere trabalhar com influencers que tenham públicos menores, mas bastante interação com os seguidores.

"Preferimos lidar com micro influencers, que têm entre 2 mil e 10 mil seguidores, mas que sejam realmente influentes nas suas comunidades", diz Raquel Scherer, diretora de marketing da empresa.

"Não nos interessa se você tem 100 mil seguidores, se essas pessoas não interagirem com o conteúdo."

Embora a competição nesse mercado esteja cada vez maior, Toula Rose diz acreditar que ainda há espaço para quem quer criar conteúdo original.

"Eu não me sinto ameaçada. Isso só me motiva a continuar a trabalhar enquanto o Instagram ainda estiver por aí. Nós não sabemos como será o futuro para os blogueiros. As coisas mudaram muito nos últimos anos."

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