É difícil imaginar como bilhões de toneladas de rocha podem de repente se comportar como um líquido, mas foi exatamente o que aconteceu quando um asteroide atingiu a Terra há 66 milhões de anos.
Assim afirmam cientistas americanos que conseguiram reconstruir em detalhes cada passo do impacto colossal que dizimou os dinossauros.
Amostras obtidas da cratera formada após a colisão permitiram concluir que as rochas sofreram um processo de "fluidificação".
Em outras palavras, o material pulverizado começou a se comportar como uma substância semelhante à água.
Cratera de 200 km
Modelos de computador permitiram determinar o que aconteceria se um objeto rochoso de 12 quilômetros de diâmetro vindo do espaço colidisse com a superfície da Terra.
Inicialmente, seria criado quase instantaneamente um espaço côncavo de cerca de 30 quilômetros de profundidade e 100 quilômetros de diâmetro.
A instabilidade do terreno causaria mais tarde o colapso para dentro das margens da cratera. E esse colapso geraria, por sua vez, uma reação de rebote do fundo da cratera a alturas superiores ao Himalaia.
Esses movimentos gigantescos se estabilizariam em um determinado momento, e o que restaria seria uma cratera de cerca de 200 quilômetros de diâmetro e 1 quilômetro de profundidade.
Essa cratera é precisamente a que se encontra hoje enterrada sob uma camada de sedimentos no Golfo do México, perto do porto de Chicxulub.
Como na Lua
O modelo é chamado de "modelo de colapso dinâmico de formação de cratera", e o impacto que descreve só é possível se as rochas, por um curto período, perdem sua solidez e fluem sem atrito.
Um novo estudo, publicado na revista científica Nature, apresenta evidências deste processo, baseado em material de perfuração de rochas de um anel de pico no centro da depressão de Chicxulub. Os anéis de pico são formações típicas de grandes crateras de impacto, criadas pela elevação do solo após as colisões.
"O que descobrimos ao examinar o material da rocha é que ela havia fragmentado", disse à BBC Ulrich Riller, pesquisador da Universidade de Hamburgo, na Alemanha.
"A rocha foi esmagada e quebrada em fragmentos minúsculos que tinham inicialmente milímetros. Isso produziu comportamento semelhante a um fluido que explica a base plana da cratera, algo que caracteriza o Chicxulub e outros casos de grandes impactos, como o que vemos na Lua."
A fluidificação não é um processo de derretimento da rocha, mas da fragmentação da mesma por imensas forças de vibração, explica Sean Gulick, da Universidade do Texas em Austin, nos Estados Unidos, e um dos líderes da equipe de perfuração.
"É um efeito de pressão, um dano mecânico. A quantidade de energia que passa por essas rochas é equivalente a terremotos de magnitude 10 ou 11. Estima-se que todo o impacto teve uma energia equivalente a 10 bilhões de bombas de Hiroshima."
Após sua fragmentação e fluidificação, as rochas recuperaram sua solidez para formar o anel da cratera. Esse retorno ao estado sólido pode ser visto nas amostras obtidas.
"Ela se manifesta em descontinuidades que mostram como as rochas deslizam em relação a outras rochas. Essas estruturas planas são evidências de que a rocha deve ter recuperado a força no fim da formação da cratera", disse Riller.
Cratera de Chicxulub - a colisão que mudou a vida na Terra
- O asteroide de 12 quilômetros de diâmetro fez um buraco de 100 quilômetros de diâmetro e 30 quilômetros de profundidade na crosta terrestre.
- Na sequência, a área impactada colapsou, deixando a cratera com 200 quilômetros de diâmetro.
- O centro da cratera colapsou de novo, produzindo um anel interno.
- Hoje, grande parte da cratera está no mar, sob 600m de sedimentos.
- Em terra, a cratera é coberta por calcário, mas suas bordas podem ser identificadas ao longo de um arco de cenotes - cavidades naturais nas rochas dissolvidas pela passagem da água e que acabaram virando atrações turísticas.
'Não apenas no nosso sistema solar'
A pesquisa não só lança uma nova luz sobre alguns dos dias mais catastróficos da história da Terra e sobre a extinção em massa produzida pelo impacto. Ela também contribui para o estudo de grandes crateras em outros corpos planetários.
"Estamos explicando um processo fundamental que pode ocorrer em qualquer corpo rochoso", afirmou Gulick.
"Pela primeira vez temos amostras de rochas que evidenciam o processo de deformação que permitiu que elas se comportassem temporariamente como líquido antes de voltarem a ser rochas, sem derreter."
"Este processo resulta da superposição de mecanismos de deformação. É um processo fundamental que pode mudar a superfície dos planetas, não apenas em nosso sistema solar, mas provavelmente em outros sistemas solares".
Riller e Gulick integraram a chamada expedição 364 de perfuração, que aconteceu entre abril e maio de 2016.
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